Erros Comuns na Seleção de Vestimentas de Proteção contra Arcos Elétricos

Parte 2 – Pensando no futuro, indo além das normas

Por Maria Chies

O setor de energia vem se deparando com novos desafios com as constantes mudanças de legislação, e um deles é a seleção de vestimentas de proteção térmica para proteção contra arcos elétricos.

E como os profissionais de engenharia e segurança no trabalho podem atuar para minimizar estes desafios?

Confiar em quem investe em tecnologia têxtil de ponta e que está atento às mudanças globais oferecendo alternativas seguras e amparo técnico e científico para que tais desafios sejam resolvidos da maneira mais apropriada possível. Neste segundo artigo do mês de setembro, vamos situar você e sua organização sobre os recentes estudos e avanços nos tecidos e vestimentas de proteção térmica, e que vem para suprir e corrigir desvios nas especificações técnicas de vestimentas de proteção contra arcos elétricos.

Utilização de camisetas sob a vestimenta de proteção

Com exceção das peças íntimas — que devem atender aos requisitos de não inflamabilidade e não ignição previstos na NFPA 70E —, as vestimentas de proteção térmica devem ser utilizadas preferencialmente em contato direto com a pele sem a necessidade de se utilizar uma camiseta. Para isso, aspectos como conforto e capacidade de dissipação de calor e umidade dos tecidos escolhidos são fundamentais.

Em relação as peças intimas não devem conter partes metálicas e a NFPA 70E em sua seção 130.7 (c) (9) chama a atenção até para os níveis de elastano em peças íntimas, que devem ter percentual limitado que não comprometam e não possam inflamar.

Segundo a NFPA 70E no seu Anexo M, utilizar camadas de vestimentas com resistência ao arco elétrico é uma forma eficaz de garantir a proteção exigida do sistema de vestimentas (medida, por exemplo, pelo ATPV). Mas atenção: roupas sem proteção térmica ao arco elétrico (ATPV) não aumentam a proteção e não devem ser utilizadas com esse objetivo.

Muitos pensam que usar uma camiseta por baixo resolve o desconforto da vestimenta de proteção, pois existem muitos tecidos de proteção térmica que não oferecem conforto. Mas, como o tecido da camiseta não apresenta características de inflamabilidade, seu uso é somente seguro se ficar totalmente coberto pela vestimenta de proteção térmica. Esse é um dos desafios de garantir o uso correto do EPI no dia a dia.

Nesse sentido o item M.2 da NFPA 70E aborda a Utilização de vestimentas de proteção térmica sobre camiseta de algodão: “Sob algumas condições de exposição, as fibras naturais da camiseta utilizadas podem inflamar-se mesmo quando utilizadas sobre vestimentas de proteção térmica (NFPA 70E M2.1).

Adicionalmente: “Se a exposição ao arco elétrico for suficiente para romper a camada exterior, este rompimento pode causar ignição da camiseta ocasionando queimaduras graves. Ou mesmo queimar a camiseta por dentro sem romper a camada exterior de tecido, criando o efeito “chaminé” (NFPA 70E M2.2).

Soluções inteligentes como peças de vestuário do tipo Segunda Pele, com propriedades de proteção térmica pode auxiliar nesse sentido, mas é sempre preferível que a vestimenta de proteção térmica seja suficientemente confortável e adequada ao toque em contato com a pele, evitando riscos adicionais aos trabalhadores.

Problemas relacionados a peças de vestuário de diferentes fornecedores

Uma dúvida muito comum proveniente dos profissionais de segurança no trabalho é sobre o uso de peças de vestuário de diferentes fornecedores, ou ainda, de diferentes tipos e tecnologias de proteção, diferentes marcas, etc.

A ideia de utilizar as vestimentas combinadas pode parecer atrativa inicialmente pois pode indicar em algumas implicações em redução de custos. Mas vestimentas adquiridas de múltiplos fornecedores podem apresentar diferenças significativas quanto a Padronização de modelagem (afetando a cobertura e mobilidade), Grau de desgaste após lavagens repetidas, diferentes respostas a solidez da cor, entre outras características que podem envolver diferentes vidas úteis para proteção térmica, o que pode ser fatal em casos de acidentes.

As normas internacionais não fazem previsão quanto a essa junção, na verdade se observarmos as orientações da IEC, a ideia é que um conjunto misto se ensaiado e aprovado como em sua configuração final combinada, poderia ser utilizado, mas essa avaliação é muito fraca do ponto de vista de uso real. Além disso, em caso de acidente, como ficam as responsabilidades em um processo de investigação?

Essa questão é pertinente e não tem uma resposta simples, já que vários fatores podem estar envolvidos num processo investigativo e será muito difícil, a depender da área protegida, identificar eventuais falhas no EPI em um caso real.

Tendências para a seleção da proteção em arcos elétricos DC

Um dos pontos que chama a atenção quando verificamos o direcionamento dado nas especificações de vestimentas de proteção térmica em circuitos de corrente contínua (DC) é a dúvida sobre a real eficácia das peças de vestuário neste cenário e uma tendência a superestimar ou tentar fazer aproximações para outros perigos envolvidos com eletricidade que não estão enquadrados na proteção contra efeitos térmicos compreendido pelas vestimentas de proteção térmica.

Exemplos claros de superestimação e abordagem equivoca ficam bem evidentes no setor de manutenção e recarga de veículos elétricos, que já abordamos em nosso artigo de agosto!

O crescimento de aplicações em corrente contínua (DC), como estações de recarga de veículos elétricos e sistemas fotovoltaicos, bem como os sistemas de acumulação de energia (exemplo o BESS – Battery Energy Storage System) tem levantado preocupações sobre a eficiência da proteção térmica tradicional.

Em algumas aplicações, principalmente de acumulação de energia em bancos de baterias, vemos um cenário de altas correntes de falha e consequentemente alta probabilidade de valores elevados de energias incidentes, dado as particularidades de um arco DC. Nesse caso a análise de riscos e a mitigação por métodos adequados que estão além das normas é fundamental.

Estudos recentes com diversos tecidos realizado por pesquisadores da Westex® em conjunto com laboratórios independentes apontam uma resposta muito similar aos arcos AC e DC de mesma energia. O desafio, conforme apontado pelo especialista, é na análise de riscos e mitigação dos mesmos, e um erro nesse processo pode ser fatal.

Mas como recorrer às informações para um estudo de energia incidente nesses diversos cenários de corrente contínua, e assim elaborar uma especificação técnica realmente adequada?

Se observarmos somente a norma NFPA 70E teremos um campo de aplicação limitado a circuitos com tensões de 1000 V em corrente contínua e para arcos abertos. O conhecido método de Doan é conservador e limitado nesse sentido, mas pode ser aplicado com resultados interessantes.

Quando os cenários são diversos dos limites da NFPA 70E temos que recorrer a estudos e publicações que vão muito além, e podem abranger cenários diversificados, incluindo cenários combinados entre circuitos AC e DC dada a especificidade técnica dos circuitos que via de regra trabalham na conversão DC-AC para alimentação das redes elétricas. Esse trabalho pode evitar diversos erros na especificação de uma vestimenta que de fato concilie proteção e conforto, evitando a introdução de novos riscos no trabalho diário. No Brasil a norma ABNT NBR 17227 faz menção a tais métodos e orienta sua utilização, mas obviamente tudo isso só é possível após um levantamento técnico adequado dos circuitos e sistemas de conversão e acumulação envolvidos.

Capacitação e envolvimento institucional

A seleção de vestimentas de proteção contra arco elétrico exige mais do que a leitura de uma etiqueta ou a consulta a uma tabela genérica. É fundamental integrar conhecimento normativo, análises técnicas, especificações rigorosas e um histórico confiável de desempenho do tecido e da peça final. A adoção da NFPA 70E deve ser acompanhada de uma interpretação técnica correta, levando em conta o contexto local e os desafios emergentes, como os riscos em circuitos DC ou circuitos mistos e em diferentes cenários do setor elétrico.

É evidente que esse processo é totalmente dependente da capacitação dos profissionais de engenharia e segurança no trabalho, mas também dos fornecedores de vestimentas de proteção térmica e fabricantes têxteis.

Atingir níveis de excelência na proteção térmica é um grande desafio e requer muito comprometimento, uma história de desenvolvimento tecnológico, investimento em tecnologias que visam não somente a proteção, mas todas as demais propriedades que um tecido deve oferecer para o uso diário da vestimenta de proteção térmica sem induzir negligência por parte do trabalhador nas atividades e ambientes mais desafiadores.

Espero que tenha aproveitado nossos artigos deste mês! Continue conectado pois sempre trazemos novidades por aqui… até a próxima!

 

Referências

  1. NFPA. NFPA 70E: Standard for Electrical Safety in the Workplace. Ed. 2021.

  2. Brian Shiels et.al. “A comparison of fabric arc ratings and the performance of arc rated clothing exposed to arc flashes generated using ac and dc energy sources”. 2025 IEEE Electrical Safety Workshop – USA.

  3. ABNT. NBR 17227: Vestimenta de Proteção contra o Arco Elétrico. Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2023.

  4. EASYPOWER. Ten Most Common Errors in Arc Flash Studies. Disponível em: https://www.easypower.com

  5. CSE Magazine. Criteria for Selecting Arc Flash Protection Techniques. Consulting-Specifying Engineer, 2014.

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